quinta-feira, agosto 03, 2017

DA FIBRA LASSA DA CARNE INIMIGA



dedicado à Cantinho e ao Cabrita, Cortez e cercante comitiva cagona 

Andamos a juntar para um inimigo que se veja, fazer um antagonista a sério de uns restos de gente, pontas, piriscas e cantinhos, do rebotalho que para aí vai nas letras, de umas fonsecas e uns amarais, da grã-finesse às faxineiras repimpadas com os doutoramentos magna cum laudas, reunir isso tudo, reciclar em frankenstein, num processo paciente de colagem, uni-los num monte, já não digo um que se veja do espaço, tanto não é preciso, não queremos godzillas, mas a gente já se contentava se o visse a uns passos de distância, o que desse para um duelo daqueles à antiga, assim pegamo-los um a um e atiramos tudo num saco, empina-se com um pau a ver se ganha forma, altura, leva farinha a ver se engrossa essa massa de poetas secundaríssimos ou figurantes, ensaístinhas de merda, dizia-me hoje um comparsa que temos o azar de ter para a esgrima destes dias um génio odioso mas tão badameco, umas inimizades que não dão orgulho sequer para um gajo se imaginar a arrancar-lhes a cabeça para enfeitar as paredes, ficariam aquelas carantonhas ainda babando umas para as outras, imortalizadas naquele espanto estúpido à pesca de um elogio, não dá o menor ânimo de lhes acertar um bem nos queixos, quais queixos, não passam de foles, um longo e tortuoso intestino, um serpentário que parece uma ala de almas leprosas, é aquela que foi buscar este ano o prémio tendo no ano passado estado no júri, uma bruxa chata metida em tudo o que é chá, rifas, bolinhos da fortuna, pelo caminho apresenta o livro deste, génio, do outro, génio, e daquele que em tempos teve a fúria dos trezentos traques de júpiter e hoje não passa de um peido velho, que num bar se vem sentar no teu lugar e, quando voltas de uma mija, faz-se apresentar, mete logo a quinta mudança e vem com prelecções de grande pai tutelar, ursa maior, a ensaiar leituras frias de cartomante parola, e que, ao ser ignorado, levanta-se pobremente e vai-se a outra caneca de cerveja cofiar a barba de espuma e a divisar a crónica que irá escrever no dia seguinte, no primeiro buraco de jornal, a ajustar contas contigo, a gabar as miúdas como nozes para as quais lhe faltam há muito os dentes, e a ti, derramando a rara palavra que lhe deste, nem te dando o nome e logo enfiando-te outras javardices na boca para dar certo com o delirium tremens lá do sermão constante para a sua paróquia, ainda chamando alguns mortos para tos atirar em cima, te dar com eles nos cornos, como bom demónio que és nas mãos destes padrecas exorcistas, já vai alinhada uma série tal de fabulosos talentos que te tomaram de ponta, deves ser tu o bicho que vão esfolar para a carpete à entrada da academia das letras que hão-de fundar, uma série tão notável mas a que é tão fácil perder a conta, lista de números para bingo no esquema das ordinarices promocionais, festivais, marias indo, vindo, fantasistas da sua própria reputação, gente imensamente respeitável, génios numa tal quantidade que mais uns anos e o panteão terá de ser alargado pelo menos até ao algarve, uma gente que toma grandes ofensas lá no bom nome, mandam vir as mães e os notários, os tios, as primas, as sobrinhas que precisam de bênção lá na faculdade, no pardieiro da editora, e nós cá estamos, ainda a amealhar, a encher o porco antes de o partir, ainda longe de o retalharmos com a faca de trinchar, esta porcaria de gente formando o seu cartel, declarando-te as suas guerras e prometendo linchamentos, gente que se diz reformista, grandes espíritos que acham que o mundo vai muito mal, tadinho, mas não vêm a ligação de nada com nada, no que lhes diz respeito ou os envolve: tudo perfeito, mil maravilhas, aliás, milhões, para estes isto anda tudo é desligado, e o facto de andarem a entrar e a sair uns dos cus dos outros, isso é besides the point, não tem nada a ver a fraude, os compadrios permanentes, as repetições inanes de elogios dos mesmos aos mesmos, de manhã cobre este aquele, de tarde trocam, e de noite todos os gatos têm de passar por parvos e tirar os ratos da ementa, porque estes, afinal, têm grandes planos para sair juntos do subterrâneo e render a guarda, manter o nível das águas, do lodo, se não gostam do que escreves ligam para o jornal a exigir despedimentos, querem cabeças os da liberdade, querem a forca, a cadeira eléctrica para quem escrever uma linha a dizer: atenção, isto aqui cheira mal, não é só lá no reino da dinamarca, cá também a temos, essa podridão das infinitas alianças, essa paz construída com a argamassa do nojo, gente muito contente de se lavar na merda da indiferença, quando ser um pouco melhor custa uma vida, e às vezes não chega, um pouco melhor, e só isso já faria grandes diferenças, já dava para começar por algum lado a revolução, seja em que sentido for, sem aproveitar de imediato a ninguém, puxar o pé atrás e assestar um chuto no cu desta mula parada no caminho, a provocar filas só para depois se atribuir funções de sinaleiro.


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